Uma análise filosófica sobre o instinto primitivo e a obsessão humana por sangue
Por Ana Lima
Analisar o
terror-thriller Dementia 13: The Haunted
and the Hunted, lançado em 1963, dirigido e escrito por Francis Ford
Coppola não é somente uma questão de imagem. A narrativa estilisticamente
gótica percorre a maldição que envolve a nobre família Haloran. Num ritual não
menos doentio que propriamente vazio, a família se reune todos os anos para
celebrar o memoral da irmã Kathlein. O ritual mostra-nos muito mais sobre a
mesquinhez que perfaz as relações familiares fadadas ao vil vínculo monetário
até os mais profícuos e sombrios espaços da natureza humana; a cada gesto, nem
por todas palavras trocadas e pelos silêncios mórbidos percebemos qualquer
vínculo que mantenha-se na mera e genuína afetividade familiar. A atuação de um
assassino nas imediações do castelo utilizando um machado para dilacerar suas
vítimas, por vezes, passa despercebida diante de toda a conjuntura esfacelada de
uma estrutura familiar que nos lembra que onde reina o dinheiro e o poder não
há espaço para o afeto singelo e genuíno.Toda a relação entre os irmãos John,
Richard e Billy é tão deprimente que nos nutre mais compaixão por tais
personagens do que raiva e desprezo.
O grande drama
familiar parece estar acima de qualquer materlada sangrenta e o que se esfacela
na verdade é a própria natureza humana; a cada golpe sendo aniquilada e
novamente, apenas para mais uma vez fracassar, renova-se. Este desespero em criar-se
e a tudo destruir, ímpeto humano, é o fascínio que nos prende a Dementia 13, pois vemos a nossa essência
ali exposta, dilacerada. Nas palavras do grande poeta Augusto dos Anjos:
“É a
obsessão de ver sangue. É o instinto horrendo
De
subir, na ordem cósmica, descendo
Á
irracionalidade primitiva
É a
natureza que, no seu arcano,
Precisa
de encharcar-se em sangue humano
Para
mostrar aos homens que está viva!”
Longe de qualquer "realismo, a força expressiva dessa figura
trágica imaculada pela matriarca Lady Haloran nos revela apenas uma pessimista
que se arma de um discurso bem articulado para manter o status quo. Essa inteligência propriamente feminina é intimidadora
e inquietante. O que fascina no filme não é que ele ofereça mais elementos para
que aceitemos a celebração da morte, de sorte que poderíamos facilmente deduzir
ou inferi-la a partir do que nos foi dado. O que fascina é justamente que não
haja um propósito de responder à incerteza que nos é apresentada. Essa tensão é
aquilo que eu considero filosófica. Pois diante disso vê-se que o tema, a
celebração da morte, não é mais que um aspecto secundário. O filme trata da
construção de narrativas e dos limites impostos por crenças gerais.
O propósito
de Dementia 13 não é responder, senão
tensionar cada vez mais a questão que apresenta. Se a solução do filme não
basta para que aceitemos a explicação proposta, fica então mais evidente seu
pendor filosófico e sua qualidade artística. Imaginas onde o mundo descansa em
paz? Jamais no enorme Castelo Haloran.
Dementia
13 (EUA/ING/IRL,1963)
Direção: Francis Ford Coppola
Elenco: William Campbell, Luana Anders, Bart Patton, Mary Mitchell, Patrick Magee e Eithne Dunn.
Duração: 75 minutos
Classificação: 16 anos
Direção: Francis Ford Coppola
Elenco: William Campbell, Luana Anders, Bart Patton, Mary Mitchell, Patrick Magee e Eithne Dunn.
Duração: 75 minutos
Classificação: 16 anos
Sinopse - “Demência 13” conta a história de uma
maldição envolvendo uma nobre família irlandesa que vive no enorme Castelo
Haloran, uma edificação de pedra no melhor estilo gótico que foi atingida
pela tragédia da morte de Kathleen, uma criança que se afogou no lago da
residência quando brincava com seu irmão Billy. Após o acidente fatal, a
família se separou, ficando apenas a matriarca Lady Haloran vivendo no castelo
com seus criados Arthur e Lillian. Porém, a família, formada ainda pelos irmãos
John, o escultor de estátuas Richard e o jovem Billy Haloran, reúne-se
todos os anos para celebrar o memorial da morte da irmã Kathleen. Passados
alguns anos da morte da garota, quando a família se encontra novamente
para mais um memorial, um assassino começa a atuar nas imediações do castelo utilizando um
machado para dilacerar suas vítimas.
Serviço:
Dementia 13 - 23 de maio, na Sala Walter da Silveira (Rua
General Labatut, n 27 subsolo da Biblioteca Pública dos Barris - Fone:
3116-8120). Horário: 18:30h. Entrada franca.
Realização: Pig Arts e Gore Bahia. Apoio: Fundação Cultural do
Estado da Bahia (FUNCEB), através da sua Diretoria de Audiovisual (DIMAS).